terça-feira, 20 de janeiro de 2009

Um país de canalhas


Boas. Como disse ontem, na sexta feira fui a (desculpem-me eu ainda não encontrei a crase no meu teclado...) escola mais cara de Kyoto, uma das mais caras do Japão. Vamos pular o lugar comum, e não falar do prédio de seis andares, com vários elevadores é claro, onde eu me perdi, obviamente ,
(bem, eu me perder não é um parâmetro muito bom, quando cheguei da Europa, eu fiquei na dúvida por exemplo de qual era o meu apartamento e tive de verificar o número certo lá embaixo na caixinha do correio), mas enfim, as instalações da escola são melhores do que de qualquer faculdade/universidade que eu tenha visto no Brasil e também no Japão. Mas o que me chamou a atenção não foram as mais de 25 salas multimídia, ou as mais de 15 salas de reunião, o que chamou a atenção foi que, tudo que eu vi lá, eu vi também nas escolas públicas aqui.
Mas calma, eu explico. Por exemplo, na escola pública, bem como nessa super escola, cada professor tinha um laptop e uma bancada para trabalhar. É claro que na escola pública era um laptop mais humildezinho, com uma bancadinha mais feinha e uma cadeira menos confortável, na escola particular os professores tinha um mac igual ao meu, bancadas espaçosas, poltronas confortáveis, mas enfim, tinha. As salas multimídias eram muitas na escola particular, com um computador para cada aluno mais um monitor extra para cada dois alunos, na escola pública não, era um computador para cada dois alunos, mas tinha.
Eu vi na prática o que a gente já sabe há muito tempo: o problema no Brasil é desigualdade. Não dá para comparar escolas públicas com privadas, como não se pode comparar hospitais públicos e privados, bairros ricos e pobres e por aí vai. O Brasil é um dos campeões de desigualdade no mundo. Li um relatório do World Bank de 200o que dizia que no Brasil, para cada dólar gerado, 0,1 centavo ia para o mais pobre. No Vietnã por exemplo, eram 0,4 centavos. Isso quer dizer na prática que o Brasil teria de crescer 4 vezes mais do que o Vietnã para o pobre brasileiro no final ganhar o mesmo que o pobre vietnamita (não, o Brasil não cresce 4 vezes mais do que o Vietnã, na verdade tem uma taxa de crescimento MENOR do que a do Vietnã).
É meus amigos, vivemos, ou melhor, vocês vivem em um país canalha. O problema é que a gente se acostumou com essa canalhice. Na escola mais cara de Kyoto, não há congestionamento de carros com os pais deixando ou buscando os filhos, porque no Japão as crianças, desde os seis anos de idade, vão para a escola SOZINHAS, andando ou de ônibus/metrô. Elas andam por highways , estradas de alta velocidade, movimentadas, como na foto acima, porque todos sabem que não haverá nenhum boçal dirigindo a 150 por hora, nenhum motorista de taxi afobado ou caminhoneiro bêbado. No Brasil a minha amiga tem de proteger o blog onde posta fotos do filho pequeno, com medo da criminalidade. Se ela tá exagerando? Hum, ontem ouvi aqui pela CBN Brasília que encontraram o corpo de uma menina de seis anos, com sinais de ter sido violentada, em algum lugar do entorno. A avó que cuidava dela e de mais 18 netos pequenos, está desconsolada. Parece que um carro parou na porta quando a menina brincava e, com uma moeda, atraiu a menina para o carro. É que ela era da parte mais pobre. Do Brasil que vai frequentar escola pública, ser tratado pelo SUS e morar na boca do lixo. E a distância desse Brasil para o Brasil em que vocês vivem, acreditem, é maior do que a distância entre mim e vocês agora. Uma avó que tem de cuidar de 18 netos... é Brasil. É a canalhice a qual nos acostumamos. Quando conversava com o professor de história dessa escola, e disse a ele que no Brasil o professor ganha por hora/aula e por isso tem de dar aulas em várias escolas, ele não acreditou. "isso eu não conseguiria" ele disse. No Japão o professor trabalha de oito as seis, de segunda a sexta, na mesma escola. Parte do tempo leciona, parte do tempo corrige, planeja, atende alunos. Hora/aula é uma excrescência, um tumor de um sistema educacional doente. É uma das razões porque professores no Brasil não exigem que seus alunos escrevam. Preferem provas objetivas, raramente exigem relatórios. Os professores sabem que se fizerem isso, terão de corrigir em casa, depois das 8, 10 horas aulas do dia. Esse é um dos porquês de brasileiros não saberem escrever. É uma das razões de, apesar de 80 vagas, um concurso para juiz no Rio só consegue aprovar 4 pessoas. Hora/aula. Mais uma canalhice. O professor japonês diz que não aguentaria isso, a gente aguenta, porque como disse, acostumados estamos as canalhices de nosso país. E assim, pouco a pouco, vamos nós também cada dia nos tornando mais canalhas. Bom, agora vou pegar meu amendoim e assitir a posse do Obama. Amanhã eu conto o que achei. Beijos, canalhas!


Respondendo:

Kobelus: heheh, essa do cobertor é velha.

Elienai. Aqui no Japão a caixinah do leite, bem como aquelas bandeijas de frios, coisa e tal, a gente devolve no supermercado. Qualquer supermercado. No caso do leite ainda tem de lavar a caixinha e cortar com uma tesoura, deixando a caixinha como uma folha. Garrafas pet também vão para um lugar especial, mas em todo lugar tem o lixo de jogar a garrafa pet. Vidros, baterias e afins também têm um dia especial de coleta. E olha que aqui em Otsu o Lixo nem é tão complicado assim!

4 comentários:

Claudia Bittencourt disse...

O pior, é que a gente se acostuma a ter que aceitar essas coisas. Aliáis, a gente acredita que deva aceitar.
É aquela coisa de sempre esperar que os outros façam por nós o que nós deveríamos fazer.

Eu continuo aprendendo sempre contigo lendo aqui. :)
Beijo, te cuida!

Tonton disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Swami Abdalla disse...

É colega, é uma vida levada em uma estagnação apática.

Ainda gostaria de ressaltar que você comparou com a realidade de Brasília, eu que sou de Salvador-BA ainda me deparo com situações muito piores, em escolas "boas" daqui que não são metade das escolas normais da capital federal (como e.c.113n ou e.c.103s).

Certa vez, entrei numa sala com o retropojetor para passar umas fotos aos alunos e, pasme, nem uma tomada havia na sala.

Quanto aos outros setores como "segurança", o soldado policial militar de Brasília recebe um soldo de cerca de R$4.000 por mês, enquanto o mesmo PM da Bahia recebe míseros R$400,00 com um bônus de R$600,00 que não é incluso na aposentadoria.

Acho que não é preciso explicar mais nada. Faço de minhas palavras, as suas.

Pri disse...

Ai...gostei!
O pior é ver um monte de gente se batendo e se empurrando pra fazer o concurso da secretaria de educação. Gente que vc duvida que tenha o segundo grau...
É...
Pensar em não ganhar por hora/aula é um sonho longe demais pra mim!!!
bejo!